“Há alturas em que o trabalho de fotógrafo e de alfarrabista tropeça um no outro”, diz Paulo Gaspar Ferreira, ao contar como lhe foi entregue, por um cliente, um lote de cerca de 500 negativos fotográficos, sem saber muito bem o que tinha em mãos. Para o proprietário da loja e editora In-Libris não foi difícil reconhecer o trabalho de Emílio Biel, o alemão radicado no Porto em 1860. Além de uma intensa atividade empresarial (foi representante de reconhecidas firmas alemãs), foi fotógrafo da Casa Real e documentou em profundidade o nosso País, nomeadamente na sua grande obra, A Arte e a Natureza em Portugal. “Originais de Biel há muito poucos, por isso estas provas de contacto são valiosas”, conta o editor. “No início da Primeira Guerra Mundial, foi deportado para a Alemanha e a maior parte do seu espólio foi destruído ou vendido em hasta pública.”
Em nome do proprietário dos negativos, Paulo contactou várias instituições, mas nenhuma se mostrou interessada em adquirir a coleção. “Custou-me, porque são das fotografias mais importantes de Portugal dos finais do séc. XIX e revelam um património que, de outra forma, não conheceríamos.” Face ao risco do lote ser vendido fora do País, comprometeu-se a dar-lhe um uso comercial e a fazer uma edição que honrasse a obra de Biel. Começou por digitalizar todas as imagens, registos do nosso património natural, histórico, social e etnográfico.
Este livro, O Douro do Vinho na Obra do Fotógrafo Emílio Biel, é o primeiro passo editorial, reunindo num estojo de madeira de carvalho 70 imagens da região vinícola, em enormes folhas soltas. “Do ponto de vista etnográfico e da qualidade do enquadramento e da luz, são notáveis, principalmente se pensarmos que foram feitas nos finais do séc. XIX”, sustenta o editor. Foi o próprio Paulo Gaspar Ferreira a tratar da sua digitalização, tratamento e impressão, o que, por fotografia, demorou cerca de 17 horas. “É quase um trabalho de artesão”, diz. Daí que a tiragem do livro (no valor de €1000) seja de apenas 50 exemplares, todos numerados e assinados pelo autor.
As imagens são ordenadas segundo o ciclo do vinho, com retratos do trabalho nas vindimas, das quintas, das localidades durienses (Freixo de Espada à Cinta, Alijó, S. João da Pesqueira…), dos barcos rabelos a descer e a subir o rio à sirga (rebocados ao longo das margens por homens ou animais) ou das caves em Vila Nova de Gaia. Paulo Gaspar Ferreira abre o estojo e perde-se nos pormenores dos registos. E confidencia: “Fazer isto deu-me um gozo particular, é o tributo de um fotógrafo a um mestre”.
In-Libris > R. do Carvalhido, 194, Porto > T. 91 999 1597 > seg-sáb 10h-19h